Vivendo, contando e inventando histórias

Como o tema do envelhecimento me fisgou

Depois da experiência pessoal de cuidar, por mais de 20 anos, de familiares que entraram na velhice em meio ao meu completo desconhecimento sobre o assunto e consequente despreparo para apoiá-los, entender a velhice deixou de ser uma opção e passou a ser uma premência. No exercício desta atividade, a convivência diária com toda sorte de situações do cotidiano de um idoso de quem cuidamos e a quem nos ­ – quarentona espremida entre filhas adolescentes, saúde comprometida e vida profissional conturbada – já estavam envolvidos no tema e podiam trocar alguma vivência comigo. Não havia como conversar, compartilhar dúvidas, dividir esforços e ideias. Parecia que somente eu tinha este tipo de problema para resolver. Não havia livros, programas de televisão, sites, associações, nada que me suprisse de conselhos e orientações. Ou será que o peso da nova tarefa era tal que não me deixava ver o que havia em volta? Desconfio que não, que não havia mesmo uma maneira simples de buscar e encontrar apoio. Só nestes recentes últimos anos, a velhice entrou na pauta dos meios de comunicação. Antes disto, achar a turma que estava imersa no mundo do cuidado com o idoso era bem difícil. Reunir estas informações era tão trabalhoso que o autodidatismo pareceu ser a única saída para mim.
Fui, aos poucos, desenvolvendo métodos e soluções caseiras para realizar este cuidado a distância. Aprendi a montar uma rede de apoio e a me valer da tecnologia para monitorar o dia a dia dos meus idosos. Sem a internet, teria sido inviável a administração remota de uma casa onde viviam pessoas sem autonomia para cuidar de si mesmas. Errei muito mas também realizei muita coisa interessante e aprendi aos montes.

No ano que passou (2015), achei que seria bom poder falar sobre a velhice que eu conheço para uma plateia mais ampla e divulgar a experiência que adquiri. Reuni amigas e fizemos um blog, o Mundo Prateado (mundoprateado.com), cujo nome homenageia as pessoas de cabelos grisalhos, aparentes ou disfarçados, que estão nesta nova fase da vida. Lá conversamos sobre a velhice desde um ponto de vista realista, sem romantismo mas com uma atitude positiva. Lá defendemos que a velhice pertence a todos nós, aos velhos e a seus filhos ou amigos. Lá pensamos a rede que deve apoiar a velhice, pensamos na vida dos velhos e em quem se interessa por querer ajudar a construir um mundo digno para os prateados. Lá experimentamos fazer coisas que auxiliem esta rede de cuidados.

Envelhecer é viver e sendo assim, demanda força, energia e inteligência. Sendo velhos ou cuidando deles é essencial falar sobre o tema e procurar nossos pares. Conversando seremos capazes de enfrentar a velhice dos nossos, ou a nossa própria, mais preparados e apoiados.

Na busca deste entendimento, sempre pairava no ar a dúvida de como será envelhecer, daqui a alguns anos, com o mundo tão mudado. As famílias já tem, em sua maioria, novas configurações com pais separados, em novos casamentos ou não, e com filhos e enteados morando longe. Há os que optaram por não ter filhos e os que construíram famílias que expressam novas visões de vida. O mundo mudou e com ele o conceito de família, a instituição a quem sempre coube a maior parte da responsabilidade por cuidar dos seus idosos. Fica cada vez menos viável, para muitos, estar perto de filhos ou amigos que deem uma ajuda quando começar a ficar difícil se desincumbir das tarefas do dia a dia. A quem vamos poder recorrer quando precisarmos de cuidados intensivos ou não, provisórios ou permanentes?

Esta pergunta que, sem floreios, se resume a “como será a vida na velhice, daqui a alguns anos?” passou a dominar minha curiosidade e a perseguir respostas. Além das respostas, também queria saber das soluções para uma velhice bem cuidada. O tipo de cuidado que proporcionei aos meus idosos não será viável para mim ou para a grande maioria dos brasileiros. Cuidado intensivo, 24 horas por dia, durante o tempo de vida que pode nos restar quando não formos mais autônomos e, sim, completamente dependentes, é uma alternativa para poucos. Faltarão às famílias tempo e dinheiro.

Com uma visão otimista de que temos a nosso alcance tecnologia, inovação social e capacidade de mobilização, comecei a busca por este desenho de velhice com futuro.